terça-feira, 21 de agosto de 2007

Carta ao Juvenal

“Que tempos são esses: Nem o Juvenal tem paz!”

(Passante no calçadão da Gameleira ao ver que roubaram o livro da estátua)

Rio Branco, 21 de agosto de 2007.

Prezado Juvenal,

Já diz o povo: Agosto mês de desgosto! Pois quem nesta vida nasceu para rei, não vai se conformar com principado, não é mesmo?

Já não vivemos o tempo dos antigos bailes na Tentamen, do bilhar no Hotel Madri e do vai-e-vem dos nossos “batrícios” na Rua 17 de novembro, mas em compensação, vivemos dias de incerteza e de esquecimento...

Por que tudo isso? Ora, claro que você já sabe, senão lá vai: Roubaram teu livro! É. O de poemas, ali colocado para representar teu gosto pela leitura, tão necessário nos dias de hoje.

E não foi só isso: Atiraram com toda força possível um tijolo na tua cabeça, antes de levarem o livro, mas tens a cabeça dura nem sentistes. Em compensação sentimos nós, no nosso poeta de espírito “gavroche”, como bem conta teu parceiro de arruaças, Océlio. Sim ainda que alguns não se dêem conta, todos somos penalizados, explico:

O que faz alguém destruir um patrimônio coletivo, senão o desconhecimento de que também lhe pertence, isso é óbvio, mas o que a gente faz individualmente contra? NADA!

Sinceramente vejo todo mundo falando, mas poucas são as palavras pró-boa ação, o ato do roubo, da tijolada e do vandalismo acontecem, segundo a Christina*, em quase todas as estátuas de bronze que ela tem feito, mas o que a gente faz? A gente fala da atitude, mas não propõe algo para mudar isso, ficamos comentando o fato, mas o que mais?

Bem, eu decidi fazer algo, ah.... mas antes preciso te contar: roubaram o livro e quebraram o mármore, é fato. Imediatamente foi encomendado novo livro, colocaram outro mármore, te deram um banho e passaram cera incolor, ficaste brilhando, um luxo!

Na madrugada, hora que tu mais gostavas de andar pela rua, rindo e recitando poemas, aproveitaram e dessa vez roubaram o banco, é... o banco que permitia que alguém sentasse ao teu lado, ou que qualquer passante falasse contigo, dividisse um trago imaginário ou ficasse divagando.

Mentira? Quem dera... outra vez estás nas páginas dos jornais, nos blogs, nas rodas de conversa. Assim decidi de vez fazer algo, o que eu posso, dentro das minhas possibilidades: Todos os dias vou ao “Hotel Madri” onde trabalho. Ainda não tive a oportunidade de perguntar à dona Ida, “Mãezinha”, quem morava no “canto exato”, em que trabalho, mas tenho certeza que tu já andaste muito por lá.

O certo é que todos os dias vêm levas de alunos visitarem o prédio, acompanhados de suas professoras e seus cadernos, dos quais eles não tiram os olhos escrevendo compulsivamente, com se ao anotar pudessem aprender tudo.

Pois bem, a partir de hoje, cada vez que eu encontrar esses meninos, moças e crianças no prédio não perderei tempo e sem dó, nem piedade recitarei teus poemas e falarei de ti.

Contarei dos teus amores desvairados por Laura, das orgias que organizastes para as tuas “amigas” Esmeralda, Maria Cu-de-pau e tantas outras, só não direi do que não sei, apenas desconfio, prefiro que seja nosso segredo... deixa pra lá.

Acredito que desse jeito besta, da maneira mais simples, estarei colaborando para que os jovens conheçam as tuas poesias, que já não te pertencem, são patrimônio de cada um deles.

Espero colaborar para que não sejas só monumento e sim cada dia mais vivo e presente na nossa memória.

De resto te envio um beijo e aproveito para dizer que agora tens um segurança que zela pela tua integridade física, por que da moral é melhor nem falar.... Pra ver como são as coisas: Até hoje, passados tantos anos, ainda estás na “boca do povo”. Longa vida ao Juvenal!

Com carinho,

Karla.

*Christina Motta, é a escultora que fez a estátua e está providenciando o novo livro. Para ela, nosso abraço agradecido, meu e do Juvenal. Aproveito para convidar as pessoas para virem visitar o Juvenal, conhecê-lo, sentar com ele (o novo banco já foi providenciado) e aproveitar para escutar seus poemas, estarei às ordens.

Karla Martins, acreana, atriz e contadora de histórias.

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