segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Reflexos

Sabe aquelas tiradas rápidas, aquelas piadas criadas de momento, de pura criatividade, como diz o Elson Dantas: “Só no reflexo.”? Pois é, aqui vão algumas que a memória me permite.

Marx Dantas
Chegando na redação do Página 20, bem vestido, sempre cheiroso, modernoso, cabelo impecável, unhas brilhando, o MD foi logo sapecando, com sua peculiar voz de locutor:
- Foi daqui que chamaram um homem?... Ele tá vindo ali atrás.

Pheyndews
Enquanto o Pheyndews Carvalho, nosso saudoso Fé, relaxava em sua rede, debaixo do chapéu-de-palha, no fundo do quintal, a Marinete passava o rodo na lamaceira que os “ninjas” (como o Fé se referia a Pedro e João, seus dois filhos mais novos) tinham levado, da piscina para a sala do computador. De repente a “Rainha da Floresta” escorrega numa poça e leva um baita tombo. Os garotos correm desesperados para acordar o pai, em busca de socorro. Fé, mesmo mal humorado, não perdeu o reflexo.
- Pai, pai! A mamãe caiu na área.
- Caiu na área? Então pode marcar que é pênalti!

Beneilton Damasceno
Após revisar, corrigir e copidescar a matéria, o professor Bené depara-se com um dilema ao ver a assinatura do autor do texto. Tratava-se do jornalista Diego, que possui um sobrenome bastante original: Pintro. Ora, como é corriqueiro no mundo das redações, words, teclados mal tratados e digitadores apressados, Bené foi tirar a dúvida com o editor Tião Vitor que prontamente esclareceu, confirmou e tranquilizou o nobre revisor.
- É Pintro mesmo, professor. Pode ficar sossegado.
O Rei dos Trocadilhos, professor Bené, não podia perder mais esse e sapecou:
- Tá vendo chefinho, se a gente não presta atenção. Se fosse um erro, o revisor é quem pagaria o “patro”!

Quando eu me lembrar, conto mais

Sem comentários

Veja mais no Acredite se Quiser.

Arquitetura do cacete

Veja mais no Acredite se Quiser

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Digo nada!

Se você visse a mulher de seu amigo, num ato suspeito, de provável traição, você contaria pro "pobizim"? Pense bem! Diria é?
Pois eu não, num diria pro bidongado nem coscarai! Deixava ele descobrir sozinho, porque, inevitavelmente a gente sempre descobre, mesmo que seja depois que todo mundo e as capas do fundo já saibam.

Aprendi, faz é hora, que quando você fala um tipo de coisa dessas, perde o amigo, ganha fama de fuxiqueiro, mata a confiança do amigo, justamente quando você procura ser leal com ele, que inda diz mermo assim: - E tu sabia de tudo isso, o tempo todo, fí de rapariga, e num me disse nada!?

Termina que a mulher convence o malagradecido de que ela sempre foi fiel, que é tudo mentira, que fulano é só um primo-segundo que mora na colônia e "vei ver se arruma um jeito de ir pra Goiânia, pá se operar da prósta!".

E desce a lenha em quem disse uma calúnia dessas. Se defendendo e te atacando, diz que é a mulher mais honesta do mundo, que o sujeito é que devia escolher melhor as amizades, que isso e aquilo outro. Diz que não era nada daquilo que "esse fela da puta desse teu amigo tá falando!" e que "ele é que vive dando em cima de mim e tu nunca prestou atenção, viu!”

Resultado:

Teu ex-amigo, além de perdoar a safada, sair numa segunda lua-de-mel pela Europa com a bandida, comprar uma Hilux, zero bala, pra pistoleira, nunca mais vai pagar umas geladas pra ti, num vai querer te ver nem pintado de ouro. Capaz até de te chamar pros paus, te meter uma pisa, te dar uma facada e te botar pra correr debaixo de chumbo.

Digo nada! Sinto muito meu amigo, mas eu mermo num digo não, tá? Vou até ficar abismado, estarrecido e tomar umas com você, quando tudo vier à tona. Eu hein!

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Bulindo com Shakespeare

Soneto I

From fairest creatures we desire increase
That thereby beauty’s rose might never die,
But as the riper should by time decease
His tender heir might bear his memory:

But thou, contracted to thine own bright eyes,
Feed’st thy light’s flame with self-substancial fuel,
Making a famine where abundance lies,
Thyself thy foe, to thy sweet self too cruel.

Thou that art now the world’s fresh ornament
And only herald to the gaudy spring,
Within thine own bud buriest thy content
And, tender churl, mak’st waste in niggarding.

Pity the wold, or else this glutton be:
To eat the world’s due, by the grave and thee.


Tradução de Jorge Wanderley

Dos raros, desejamos descendência,
Que assim não finde a rosa da beleza,
E morto o mais maduro, sua essência
Fique no herdeiro, por inteiro acesa.

Mas tu, que só ao teu olhar te alias,
Em flama própria ao fogo te consomes
Criando a fome onde fartura havia,
Rival perverso de teu próprio nome.

Tu que és do mundo o mais fino ornamento
E a primavera vens anunciar,
Enterras em botão teus suprimentos:

- Doce avareza, estróina em se poupar.
Doa-te ao mundo ou come com fartura
O que lhe deves, tu e a sepultura


Tradução de Ivo Barroso

Dos seres ímpares ansiamos prole
Para que a flor do belo não extinga,
E se a rosa madura o Tempo colhe,
Fresco botão sua memória vinga.

Mas tu, que só com os olhos teus contrais,
Nutres o ardor com as próprias energias
Causando fome onde a abundância jaz,
Cruel rival, que o próprio ser crucias.

Tu, que do mundo és hoje o galardão,
Arauto da festiva Natureza,
Matas o teu prazer inda em botão
E, sovina, esperdiças na avareza.

Piedade, senão ides, tu e o fundo
Do chão, comer o que é devido ao mundo.


Tradução Fabrício Souza

Ao mais raro desejamos que cresça
Que a rosa da beleza nunca morra
Mas o fim do maduro é que apodresça
Só o doce herdeiro evita que isto ocorra

Mas tu, que só aos teus olhares atenta
Alimenta a ti com teu próprio ser
Passando fome onde abundância assenta
A ti mesmo hostil sendo sem saber.

Tu que já do mundo é fresco ornamento
Da primavera único mensageiro
Enterra em botão teu contentamento
Desperdiça em acumular dinheiro.

Apiede-se do mundo, ou se é sem fé:
Come o que do mundo por direito é.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Carta para Ribinha

O Piauí é um dos lugares do mundo, que o mundo não conhece. É um dos lugares mais lindos do mundo. Mas agora estou falando das pessoas de lá, que são as pessoas mais lindas do mundo de lá, daqui e dacolá.

Foi lá no Piauí, em Bom Jesus do Gurguéia, sul de lá, beirando a Bahia, bem longe do Ceará que eu conheci o Ribinha, um fuleiro (antes de mais nada), locutor, comunicador, entendedor da vida e uma bela criatura de Deus. Foi o Ribinha quem me disse que aquele inseto andando no meu braço era um chato.

Outro dia (naquele tempo), o Ribinha foi preso.

- Prenderam o Ribinha! – Disse a recepcionista da Rádio Cultura do Gurguéia. Eu a ouvi dizer isso para o diretor da rádio, meu chefe. Mas o Ribinha era meu “subordinado” (É. Entre aspas mesmo, porque ninguém tinha poder para subordinar o Ribinha). Tomei as dores.

-Vem cá. Que estória é essa? O Ribinha foi preso porque?
- Cachaça, né, Braga!
- Então vamos lá, nos entregar também! – Risos.
- Tu sabe como ele é. Tu conhece o Ribinha né, Braga!?...

Eu num conhecia era porra nenhuma, mas sabia que ali, naquele lugar tão pequeno, tinha muito mais gente pra ser encarcerada e privada de fazer o mal e o Ribinha não fazia parte deste rol. Ele apenas falava. O Ribinha falava. Ele vivia da fala. E, quando bebia, longe do microfone, aí é que ele falava.

Pois bem:

O Ribinha foi preso por conta de uma discussão político-ideológica-de-balcão-de-boteco com um advogado, o delegado, que tinha perdido oito partidas de sinuca pro Ribinha, o bebo. E, segundo a lei da sinuca, não sendo aposta em dinheiro, o perdedor teria que pagar as fichas e as doze cervejas que o Ribinha não bebeu sozinho. De fora apenas a garrafa de cachaça que o Ribinha bebeu sozinho.

- Bora lá, ver o que a gente pode fazer?
- Hum... Deixa de ser besta, Braga – Disse o chefe. – O Ribinha se vira!
- Hum... – Disse eu.- Então tá. Daqui a vinte minutos, tu vai ali no estúdio e, ao vivo, responde às oitenta cartas dos ouvintes do Ribinha, que chegaram hoje de manhã. Galho fraco pra ti, né não?
- Bora.

Era um domingo de sol quente, uns quarenta e dois graus, naquela tarde de setembro, no Vale do Gurgúéia, sul do Piauí (Pleonasmo). Faltavam quinze minutos para entrar no ar o melhor programa da Rádio Cultura do Gurguéia, a maior audiência, o melhor locutor, o maior número de participação ao vivo, o maior faturamento.

Eu tava suado e apreensivo, ouvindo o papo prolixo do diretor com o oficial do dia (O delegado faltou). Enquanto todos os livros de Direito eram dissecados, peguei pelo braço um plantonista que também prestava atenção na conversa e, achando graça, sacudia um chavezona destamãe.

- Cadê o baitola? – Eu disse- Me leva lá na cela do encrenqueiro.

Uma gargalhada, daquelas que só são produzidas por homens livres ecoou pelo corredor do chilindró e uma voz irreverente sentenciou:

- Tu é foda mesmo, Braguinha! Esperou que faltasse só cinco minutos pra começar o programa, pra vir aqui me soltar. Nem adiantou eu te agradar com aquela lata de Neocid, mode tu matar tua carga de chato.

Vinte cartas foram lidas e atendidas no programa do Ribinha daquele dia. O restante delas eu não consegui entender a caligrafia.