quarta-feira, 25 de maio de 2011

Transaquáticas

A gente transou dentro de uma banheira, no banheiro da Casa Amarela, de dia, enquanto uma fila enorme esperava irritada do lado de fora. Transamos de madrugada, no fundo do ônibus que, em alta velocidade subia a Serra da Borborema. No alojamento, no festival de teatro, transamos sob o cobertor, sobre um colchonete dentre os outros, onde outros fingiam dormir.

Corremos nus pela imensa e deserta praia alvinha de Morro Branco, depois que transamos nela, num labirinto de falésias. Insignificantes corpos despidos, entre o céu mais azul possível e a mais fina rajada de areia daquela duna de Canoa Quebrada, transamos até arder. Gastamos milhares de metros cúbicos de água, quando transamos sob a ducha morna da suíte do hotel em Garanhuns.

Me queimei na caçarola de espaguete, ao tentar me apoiar no fogão, quando tropeguei exausto, depois que transamos na cozinha. Quando vim do quintal, após me assear na beira do rio Gurguéia, assisti teu sono por horas e tu, deitada de bruços, nua, suada, brilhante afastou mais um pouquinho as pernas e transamos de novo, enquanto dormias, dentro da barraca.

Perdi a conta das estrelas piscantes e objetos voadores não identificados que vimos, deitados sob a ribalta mais clara que a lua já conseguiu se destacar. Então, transamos ali, no palco mais chuvoso da Amazônia Legal. Na rede maior que nos ofereceram, transamos. Agradecemos e pegamos a estrada de volta ao lugar de onde viemos. No caminho, transamos sob muitas nuvens e nos molhamos no poço jorrante de Cristino Castro.

A gente brigou, chorou, se arrependeu e pediu perdão um ao outro, depois nos beijamos e transamos ali mesmo, nos fundos do Casarão. Transamos, subindo a escada do Manoel Julião. Caímos do sofá e transamos no tapete. Nós transamos muito. Transamos demais. Ainda assim, eu acho que transamos muito pouco. Sempre me pergunto porque não transamos mais.

Quando chegamos em nossas águas salgadas, poluídas e cansadas de tanto nos bater, com sabão em pedra, pra nos limpar, esfregamos nossas vestes nodoadas. As estendemos e as deixamos quarar sob o sol mais afastado, pela maior tormenta de fim de primavera, do sul do Brasil. E, sucumbes ao vento forte, vindo das ventas da morte, nos afogamos para sempre quando transamos no mar da Terra do Fogo.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Mais segurança na UFAC!

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Do Ceará

Sou do Ceará
 
Ricardo Gondim

Ser do Ceará é mais do que nascer no Ceará, é conseguir reconhecer, à distância, uma cabecinha redonda, um sotaque cantado, uma orelha de abano, um jeito maroto de encarar a vida.

Ser do Ceará é saber a estação certa de colher um sapoti, conhecer os vários tipos de manga e nunca comprar ata verde demais; é dar sabor a um baião de dois com queijo coalho.
Ser do Ceará é gostar de cocada, de suco de tamarindo, de siriguela vermelha, de água de côco docinha. 

Ser do Ceará é engolir o final dos diminutivos - cafezinho vira cafezim; Antônio vira Toim; bonzinho vira bonzim. Lá se fala aperreio na hora do sufoco; o apressado é avexado; o triste fica de lundu; quem cria problemas, bota boneco.

Ser do Ceará é morar onde os muros são baixos; lá todo mundo sabe da vida alheia. A melhor conversa entre cearense é fofocar. Aparecer em coluna social sempre foi o máximo. Pense nos que pertencem a família com pedigree?  Eles fazem parte dos eleitos: Studart, Frota, Távora, Jeiressati, esses, sim, são considerados o supra-sumo. 

No Ceará não se compra casa do lado do sol; ninguém valoriza casa com a frente voltada para o poente. O sol não perdoa; é inclemente, ardido, feroz, cansativo. No Ceará, quem não souber lidar com o astro rei, dura bem poquim. Entre dez da manhã e cinco da tarde, esse bichim brilhante deixa todo mundo melado; não existem peles secas no Ceará, todas são oleosas. 

Ser do Ceará é aprender a dormir de rede, a gostar do cheiro de lençol limpo, a tomar banho frio, a valorizar a brisa do mar. Lá o perfume de sabonete tem outro valor. No Ceará as mulheres não usam meias finas, os homens não toleram gravatas e as crianças não sabem o que é uma blusa de lã. 

Ser do Ceará é ter orgulho de afirmar que pertence à terra de José de Alencar, Patativa do Assaré, Fagner, Eleazar de Carvalho, Clóvis Bevilácqua. Lá amam-se as artes. Não tem coisa mais bonita que assistir a um repente na praça do Ferreira. Como se  cria repente com facilidade. Está no sangue conversar com rima. 

Ser do Ceará é lidar com umidade, com camisas empapadas de suor, com mofo, com moscas aos milhões, com muriçocas impertinentes, com baratas avantajadas, com viroses brabas, com desidratações súbitas. Lá os fracos morrem rapidim. O darwinismo, teoria da sobrevivência dos mais fortes, se prova facim. No Ceará, nuvens negras são prenúncio de bom tempo e relâmpago, uma bênção. Em dia chuvoso ninguém quer sair de casa.

Ser do Ceará é rir por tudo. E tudo vira piada. Em um dia lendário, estava nublado, quando o sol resolveu rebentar as nuvens... e levou uma sonora vaia. Não conheço nenhum povo que tenha vaiado a estrela maior.

Os cearenses são antes de tudo uns fortes. Ao mesmo tempo, deliciosamente bons e perversamente maus. Lá é terra de pistoleiro e de santo, de revolucionário e de coronel caudilho, de guerreiro e de preguiçoso. 

Sou cearense. E por mais que tenha me afastado, não consegui apagar o meu amor pelo chão que me acolheu no mundo. Lá nasci, casei e tive filhos. No Ceará, despertei para o mundo, como também, infelizmente, sepultei o restim de esperança que nutria pela humanidade. O Ceará foi o meu ninho e é o túmulo dos meus ideais. Em Fortaleza, tive as maiores alegria e as mais duras agonias.

Contudo e apesar de tudo, continuo enamorado do meu berço. Não pretendo desvencilhar-me de ti, loira desposada do sol. 

Soli Deo Glori

Ricardo Gondim é pregador do evangelho de Jesus Cristo e fundador da igreja Assembléia de Deus Betesda. Leia mais sobre o polêmico reverendo Ricardo Gondim que disse: "Deus nos livre de um Brasil evangélico!" e afirma ser a favor da união civil gay, em entrevista na Carta Capital

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Sexismo, humor e publicidade

As grandes fazem rumas maiores. Veja um dos VTs da nova e péssima campanha da Bombril criada por Francesc Petit, o "P" da agência paulista DPZ. Comercialzinho besta, sem a menor graça e sem a peculiar genialidade de suas campanhas anteriores quando Petit fazia dupla em criação com Washington Olivetto, o "W", da famosa W/Brasil.




Aprendi que humor mau feito, forçado e sem propósito não é nada recomendável à saúde de uma boa publicidade.

Mas os caras vão com tanta sede ao pote de ouro da boa propaganda de humor que tropeçam e quebram tudo, de onde acabam saindo essas “pérolas” abomináveis.
Mexer com sexismo associado à venda de produtos domésticos e tentar fazer piada nova com tema tão batido, não é pra qualquer Washington Olivetto de R.U. e shopping center não.
E olha que eles sabem bem como não se deve fazer.

Para relembrar, taí uma série de anúncios machistas de algumas décadas atrás. Mesmo naipe, mesma medida. A única diferença destes anúncios para os da nova campanha da Bombril é que eles não estavam ironizando ou fazendo piadinhas bestas, eles falavam sério mesmo.


Shhh! A mamãe está em ponto de guerra!

E porquê? Porque a cansativa lida doméstica a deixou irritável e descarrega no ócio e falta de apoio dos machos da casa. Mas se ela usasse o sabonete New Ivory acalmava os nervos. Mais uma vez o produto fica em último lugar e a apelação sexista ganha mais importância. Talvez arrancasse gargalhadas na época, mas esse anúncio é uma das mais fuleiras e imprestáveis publicidades do mundo.
 

 

 Se o seu marido descobrir... 

Que ela o trocou por outro? Não. Simplesmente que não comprou a tal marca de café. Isso é absolutamente imperdoável. Muito engraçada a piada, né? Propaganda machista explícita.
Repare que parece ser socialmente aceito que o marido surre a esposa como se fosse uma filha a quem, por força da tradição, lhe cabe dar lição a custa de palmadas. Humor aplicado ao adultério e usado na publicidade até hoje, como este do posto Ipiranga, abaixo.



Veja mais anúncios sexistas de passado nem tão distante.

 Se tivesse quebrado as unhas 14 vezes enquanto limpava um forno entenderia porque eu quero tanto este que se limpa sozinho

Uma mensagem duplamente negativa. Por um lado transmite a ideia de que a mulher é desajeitada e fútil, obcecada com as suas unhas; por outro, de que o seu lugar é na cozinha.


 Quer dizer que uma mulher consegue abri-lo? 
 
Aqui, a mulher é colocada como uma imbecil, incapaz de abrir uma tampa de garrafa rosqueável. A publicidade machista e equivocada, preferiu tratar de uma pseudo incapacidade do sexo feminino do que do aprimoramento tecnológico de seu produto, no caso, uma tampa fácil de abrir. Ora, o produto é lacrado mecanicamente na fábrica, por um robô industrial o que torna imensamente difícil de ser desrosqueado por mãos humanas comuns indiferente de serem femininas ou masculinas.


Veja mais no site Obvious

Pra terminar, uma sugestãozinha para a Bombril. Por três décadas suas boas campanhas da série com Carlinhos Moreno tem, assim como a esponja de aço Bombril, mil e uma utilidades. Muito mais que simples publicidade de varejo são uma instituição cultural e popular. Por favor chame Washington de volta!

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Perainda

Vai agora não! Deixa de avexo!
Ôxe! Fica só mais um pedacim.
Porque num deixa de ser assim?
Embalança aí na rede! Eu deixo!

Espia mais pr'esse céu mei roxo,
Algodãozado e, pelaqui, pracolá
Riscado por bicho que sabe voar
E fazer tu relaxar a cinto frouxo!

Cochila sem pressa. Espreguiça.
Assovia pr'essa moça tão linda,
Que passa deixando seu cheiro,

Olor de vida único e passageiro.
Sim, porque no fim é só carniça.
Num vai agora não! Perainda!

segunda-feira, 9 de maio de 2011

David Sento Sé escreve

Vai sim
Toda dor passa. Um dia passa. Não creio mais em dores eternas e coisas imutáveis da vida, essa coisa de: “... eu nunca vou...”.
Poxa vida! Esse “Eu nunca vou” é péssimo. 
Tem o “Eu nunca vou conseguir”, tem o “Eu nunca vou deixar”, o “Eu nunca vou poder” e tem o mais comum dos “Eu nunca” que é o “Eu nunca vou esquecer”. 
Ora tome vergonha, que esse negócio de ficar lembrando ou esquecer, é coisa que só você resolve. E pode parar de ficar culpando uma força extraterrestre por isso, como se o universo inteiro tivesse predestinado você a uma fatalidade imutável.
Esquecer, só começa com o mudar e o mudar só começa com o querer mudar. Depois é só tentar e tentar algumas vezes até que o destino cochila e você rompe essa barreira estúpida do “... eu nunca vou...” e muda. Aí esquece. 
Esqueceu? Pronto, agora é que vem a parte boa. Quando você esquece, permite a entrada de um personagem fundamental no seu reviver: O novo.  E o novo pode estar aí na sua esquina ou até, você já esteja convivendo com ele e só não se deu conta.
O fato é que pra que isso aconteça primeiro você tem que tirar a bunda da cadeira, a faca do peito, o peso da consciência, a lágrima do olho e principalmente, tirar da lembrança o passado bom. Quem vive lembrando-se de um passado bom não percebe que tem um presente péssimo e não se permite um futuro melhor.
Vai, levanta daí e repita comigo: Eu vou.

Vai, levanta! 
Ou você vai me dizer: “Eu nunca vou me levantar.”?
David Sento Sé é publicitário, marqueteiro, pintor e tocador de gaita. Escreve no blog Contar Gotas

Retratos de Rio Branco


É prudente perguntar quais, dos profissionais desta clínica, são dentistas e quais são odontólogos.


ALCINETE DAMASCENO 

Falar o quê?