quarta-feira, 27 de abril de 2011

Aldeota

Sou nascido e criado na rua Padre Valdevino, entre José Vilar e Nunes Valente, no bairro Dionísio Torres (abduzido pelo famoso bairro Aldeota, capital de Fortaleza, capital do Ceará), na casa defronte a da dona Alzira, mãe de madrinha Alderice, Nazira e Alísio, tia de madrinha Margarida, Olivar e Mairto, filhos de dona Luiza, a avó de Magali, Marcos Aurélio, Márcio Greyke e Marcílio, primos de Ângela, Egildo e Sandra, filhos do padrim Mozart, irmão da madrinha Margarida.

Maga, Marco, Márcio e Basca (Marcílio) foram (e são) meus vizinhos/primos/irmãos. É assim que me lembro deles. É assim que os amo. Minha madrinha Margarida, conhecida lá em casa como Cumade, me pegou em seu colo, me deu carão e chá de limão com alho e querosene, "mode a gripe". Me deu bolo de milho com café, não deixou a mãe me dar pisa, achou graça das minhas presepadas e dizia “Deus te abençoe!”, toda vida que eu pedia a bença.

Seu Antõe Beto tinha uma bodega sortida, ao lado da casa da madrinha. Lá ele vendia de um tudo. Era bolo maria-maluca, aluá, cocada de coco queimado (que a gente chamava de Martinho da Vila), chiclete Ping-Pong, Batom Garoto, meio pão passado com manteiga, piula-do-mato, Cibalena, pasta Kolynos, sabão Pavão e Gillette Blue Blade. Esposo da dona Albertina, pai da Aila, do  Francisco e do Aldísio, seu Antõe me ensinou a dar nó em gravata.

Vesti terno pela primeira vez pra ir numa festa muito elegante, no Clube Náutico Atlético Cearense, onde meu tio Lisboa foi receber o diploma de médico. Era um paletó antigo do meu pai. Minha mãe, exímia operadora do pedal de sua Vigorelli ajustou perfeitamente o passeio completo, cinza escuro, às minhas medidas. A gravata azul marinho, em contraste com a alva camisa de tergal, fixava o colarinho no pescoço, por meio do nó que seu Antõe atou.

Ali, em derredor daquele quadrado, numa época em que menino traquinas num tinha querer, eu tinha uma ruma de quintal pra correr atrás de queda, pés de caju, manga, azeitona e goiaba onde, vez por outra, ganhava um bicho-de-pé, puxões de orelha e Merthiolate, depois das cutucadas da carinhosa e esterilizada agulha da mãe que, com linha Corrente Laranja, pregava botões nas minhas camisas e cerzia bainhas de pernas de calças do pai.

Eita, que saudade! Tô tão longe de lá. Fazia era tempo que eu num via minha rua. Sim, porque eu vi de novo agora, só em me lembrar. E esse é o único jeito mesmo, fora uns dois ou três retratos, que carrego como bagagem, de eu rever meu quarteirão, meus vizinhos e amigos de outrora, de faz é hora. Só assim desse jeito, lembrando às custas da saudade é que eu ainda posso rever meu lugar,  lotado de histórias, minha amada aldeia, minha velha Aldeota.

Um comentário:

Gean Cabral disse...

Braga, filho de Deus, pra vê tua rua hoje basta consultar o Google Maps. http://maps.google.com.br/maps?q=-3.742417,-38.506368&num=1&t=h&sll=-3.742329,-38.506313&sspn=0.001057,0.001742&dirflg=w&ie=UTF8&ll=-3.742385,-38.506333&spn=0.001057,0.001742&z=20
De acordo com as suas coordenadas deve ser mais ou menos aí.