Desde que parti de Fortaleza, Ceará, há uns trocentos e vôte
anos, eu tenho morado em diversos lugares deste meu país varonil e escutado e
aprendido uma pá de coisa bacana no tocante à cultura, sotaques e expressões
regionais. Algumas dessas peculiaridades idiomáticas, que eu costumo chamar de “modus
falandi” são ora muito divertidas, ora extremamente incompreensíveis e por
vezes de sentido inverso de região para região.
Por exemplo, na maioria dos estados a palavra ou expressão
“baixaria” se refere a um bate-boca, uma discussão exacerbada ou briga de fato.
Já no Acre, além disto, trata-se também de uma comida típica. Consumida como
desjejum, principalmente no Mercado Álvaro Rocha, em Rio Branco, o famoso
mercado do Bosque, a iguaria é constituída de cuscuz, carne moída, ovos fritos
e coentro e cebolinha picados. Humm! É bom demais!
Uma vez eu parti de Maringá, no Paraná até Fortaleza, Ceará.
O ônibus que peguei é famoso por fazer a maior viagem por estradas do Brasil.
Sai do extremo sul do Rio Grande do Sul, cruza as regiões sudeste, centro-oeste
e entra no nordeste pelo norte da Bahia, passando pelo Piauí e Maranhão até
chegar ao Ceará. São quatro dias de viagem, cercado por gente de, literalmente,
todos os lugares do país. É uma verdadeira Babel sobre rodas.
Imagina uma criatura de Bom Jesus do Gurguéia, Piauí num
longo diálogo com uma comadre de Francisco Beltrão, Paraná sendo
mediadas pelo seu Zé, de Guaxupé, Minas Gerais? E se houver algum turista
estrangeiro dentro deste coletivo, alguém que acha que sabe falar “brasileiro”,
que tenha estudado o idioma português, em seu país de origem, com uma mestra
lisboeta? Rá-rá-rá! Coitado! Ia ficar mais por fora que pensamento de preso.
E a gente mesmo não entende toda expressão dita pelo Brasil
adentro não. Escuta essa. Presta atenção. Estávamos eu o grande amigo Dinho
Gonçalves, mais o Grupo do Palhaço Tenorino, em Ponta Grossa, Paraná.
Participávamos de um festival de teatro e como é comum nesses eventos, a gente
quer se amostrar pros novos amigos. Depois de cada espetáculo estávamos lá, em
rodadas de cerveja e muita descontração.
O Dinho “garra da viola” e sapeca uma ruma de canções bem
humoradas, como é de seu estilo. A Sandra Buh, que canta e toca muito bem também
pediu pra entoar umas modas. De pronto o Dinho entregou-lhe o instrumento e,
dirigindo a artista, sugeriu que ela, pra conquistar o público, que o próprio já
conhecia de outros festivais, cantasse aquela música do Clenilson Batista que
fala sobre um pombinho gamado numa pomba.
A Sandra é muito engraçada. Uma comediante nata. Enchia as
bochechas quando cantava “E o pombinho agarra a pomba, ai, ai, ai! E beija a
pomba, ai, ai, ai!”. Com suas caras e bocas fez o publico cantar o refrão com
ela. Conquistou a plateia do boteco, arrancou aplausos e pedidos de “Mais um!
Mais um! Mais um!”. No entanto, muito depois do improviso, nossa amiga nos
confidenciou acabrunhada, um tanto quanto decepcionada:
Enquanto o safado do Dinho se acabava e chorava de tanto dar
risada, eu esclareci o mal entendido, deliberada e maquiavelicamente engendrado
por ele.
- Não, Sandra. É que “pomba” no Acre se refere ao pênis,
né?! Eu e o Dinho nos esquecemos de te alertar que aqui, no Paraná é justamente
ao contrário.
- Esqueceram o carai, seus dois filhos de umas quengas! –
Explodiu iracunda. E o resto do grupo explodiu numa gargalhada uníssona.
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