domingo, 9 de janeiro de 2011

Atrapalhado

Sempre me atrapalhei em tentar me fazer entender pelas mulheres. As mulheres que me conhecem mesmo são: Dona Rosa, que me pariu, Laluce e Dijé, minhas irmãs de sangue, Simone, prima/irmã de coração e, provavelmente, uma ou duas das que mantive relacionamentos mais duradouros que uma noite de intimidades. O fato é que eu não conheço nenhuma delas e isso é a única coisa, nesta vida, de que eu tenho certeza absoluta.

Quando me afastei dessa ruma de mulher, me encontrei com outro tanto. Inevitavelmente, propositalmente, diga-se de passagem, me atrapalhei mais ainda. Minha primeira atração (sexual, obviamente) deu-se aos dez anos, quando me apaixonei por Lucy Rocha Lima, que tinha treze. Era tão linda! Obviamente não me lembro, de jeito nenhum da fisionomia de Lucy. Sei que era linda. E seus lábios foram os primeiros que beijei.

Descobri que mulher é uma delícia muito superior a mel de rapadura com farinha d'água, mais atraente que álbum de figurinha, mais cheirosa que café com tapioca, mais preciosa e desejável que bicicleta debaixo da cama, em manhã de natal. Dez anos! Eu só tinha dez anos quando senti o cheiro do perfume da Terezinha. Não sei... não dá pra descrever, mas acabei de lembrar o cheiro da Terezinha, o cheiro que atrapalhou meu romance eterno com a Lucy.

A Diana me fez desaprender a desenhar o Leão do Pici (mascote do Fortaleza). Larguei as peladas, no campinho, no terreno da dona Maria do Chicó, batizado Mar del Toco, alusão ao Estádio Mar del Plata (Copa da Argentina, lembra?), pra ficar em casa lendo O Pequeno Príncipe, O Menino do dedo verde e sonetos de Vinícius de Moraes, ouvindo Bolero de Ravel e Ópera do Malandro pra depois escrever uma carta pra minha amada, que morava a duas quadras da minha casa.

No turno da tarde, do Colégio Joaquim Albano, só estudavam meninas. Era uma ruma de mulher! Os treinos de voleibol, handebol, basquetebol, dança moderna e o escambol aconteciam depois da aula da tarde e entravam pela noite. De manhã, a carteira 18, da 6ª A perguntava: “Oi. Como é teu nome? Sou Márcia, quer me conhecer?”. De tarde, a atrapalhada carteira 18, da 6ª A respondia com rimas toscas e desenhos idem. A Márcia era de tirar o fôlego. Linda, ruía as unhas e jogava vôlei.

O treino de handebol acabou mais cedo. Aproveitei pra distribuir nas salas, cheio de moral, com o aval do diretor Sebastião Praciano, o jornalzinho do Centro Cívico e recolher material (poesias, redações, etc) para a próxima edição. A Gracinha era uma morena de olhos grandes, peitos grandes e grandes lábios que escondiam o fim do fecho-ecler do jeans. Exímia instrutora de beijo de língua, sentava na carteira 18, da 6ª A, do turno da noite. Fiquei tão atrapalhado que perdi o último ônibus.

A Lucrécia tinha o corpo perfeito. Andava como se tivesse uma tachinha sob cada calcanhar. Meio que saltitante, flutuava na ponta dos pés. Praticava Dança Moderna na Academia Regina Coelis. Seus seios jamais recuaram sob a pressão dos meus abraços. Sua língua, invariavelmente me deixava sem fôlego, seus braços me deixavam sem forças, suas coxas me adormeciam da cintura pra baixo, sua magnífica bunda atrapalhava o trânsito.

A Terezinha era surda. Com sua vozinha gemida, frágil, infantil falava pouco. De sua boquinha linda só saíam sussurros, sorrisos e palavras essenciais. O Jaílson foi um bom amigo e mestre, talentoso artista plástico, me deu preciosos livros e dicas que impulsionaram minha carreira. Namorado da Terezinha, Jaílson era perito em LIBRAS e alfabeto manual. Mas, o que ajuda, as vezes atrapalha. Jaílson acabou o namoro porque Terezinha falava demais.

Mulheres falam mesmo. A primeira vez que ouvi a palavra “buceta” foi pela boca de uma mulher. Numa briga de vizinhas, iracunda, saia levantada até os peitos, mão espalmada, batendo no tufo enorme de pelos pubianos, que se espalhavam pelas virilhas, além de sua calcinha tamanho G, dona Amália reclamava para si o exclusivo e irrepreensível direito de bater em seus filhos, pois em seu ventre foram gestados e por aquela respeitável buceta saíram.

Me atrapalhei demais, naquele tempo de ignorância acerca das mulheres. As que desejei e nunca tive, as que rejeitei, as que me rejeitaram, as amigas que me amaram e eu nem percebi, as professoras que me reprovaram, as prostitutas que me adoeceram. Joana D'Arc, Suzana, Verônica, Cristiane, Sílvia, Ângela, Teca, Marisol, Fernanda, Virgínia, Roberta, Regina, Tâmara, Norma... Norma?... Não, espera aí. Nunca houve Norma alguma! Hum! Tá vendo, me atrapalhei de novo.

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