O Piauí é um dos lugares do mundo, que o mundo não conhece. É um dos lugares mais lindos do mundo. Mas agora estou falando das pessoas de lá, que são as pessoas mais lindas do mundo de lá, daqui e dacolá.
Foi lá no Piauí, em Bom Jesus do Gurguéia, sul de lá, beirando a Bahia, bem longe do Ceará que eu conheci o Ribinha, um fuleiro (antes de mais nada), locutor, comunicador, entendedor da vida e uma bela criatura de Deus. Foi o Ribinha quem me disse que aquele inseto andando no meu braço era um chato.
Outro dia (naquele tempo), o Ribinha foi preso.
- Prenderam o Ribinha! – Disse a recepcionista da Rádio Cultura do Gurguéia. Eu a ouvi dizer isso para o diretor da rádio, meu chefe. Mas o Ribinha era meu “subordinado” (É. Entre aspas mesmo, porque ninguém tinha poder para subordinar o Ribinha). Tomei as dores.
-Vem cá. Que estória é essa? O Ribinha foi preso porque?
- Cachaça, né, Braga!
- Então vamos lá, nos entregar também! – Risos.
- Tu sabe como ele é. Tu conhece o Ribinha né, Braga!?...
Eu num conhecia era porra nenhuma, mas sabia que ali, naquele lugar tão pequeno, tinha muito mais gente pra ser encarcerada e privada de fazer o mal e o Ribinha não fazia parte deste rol. Ele apenas falava. O Ribinha falava. Ele vivia da fala. E, quando bebia, longe do microfone, aí é que ele falava.
Pois bem:
O Ribinha foi preso por conta de uma discussão político-ideológica-de-balcão-de-boteco com um advogado, o delegado, que tinha perdido oito partidas de sinuca pro Ribinha, o bebo. E, segundo a lei da sinuca, não sendo aposta em dinheiro, o perdedor teria que pagar as fichas e as doze cervejas que o Ribinha não bebeu sozinho. De fora apenas a garrafa de cachaça que o Ribinha bebeu sozinho.
- Bora lá, ver o que a gente pode fazer?
- Hum... Deixa de ser besta, Braga – Disse o chefe. – O Ribinha se vira!
- Hum... – Disse eu.- Então tá. Daqui a vinte minutos, tu vai ali no estúdio e, ao vivo, responde às oitenta cartas dos ouvintes do Ribinha, que chegaram hoje de manhã. Galho fraco pra ti, né não?
- Bora.
Era um domingo de sol quente, uns quarenta e dois graus, naquela tarde de setembro, no Vale do Gurgúéia, sul do Piauí (Pleonasmo). Faltavam quinze minutos para entrar no ar o melhor programa da Rádio Cultura do Gurguéia, a maior audiência, o melhor locutor, o maior número de participação ao vivo, o maior faturamento.
Eu tava suado e apreensivo, ouvindo o papo prolixo do diretor com o oficial do dia (O delegado faltou). Enquanto todos os livros de Direito eram dissecados, peguei pelo braço um plantonista que também prestava atenção na conversa e, achando graça, sacudia um chavezona destamãe.
- Cadê o baitola? – Eu disse- Me leva lá na cela do encrenqueiro.
Uma gargalhada, daquelas que só são produzidas por homens livres ecoou pelo corredor do chilindró e uma voz irreverente sentenciou:
- Tu é foda mesmo, Braguinha! Esperou que faltasse só cinco minutos pra começar o programa, pra vir aqui me soltar. Nem adiantou eu te agradar com aquela lata de Neocid, mode tu matar tua carga de chato.
Vinte cartas foram lidas e atendidas no programa do Ribinha daquele dia. O restante delas eu não consegui entender a caligrafia.
2 comentários:
Braga, tu continua engraçado como sempre... e contando esses "causos" vc é melhor ainda...
bju meu e abraço dos "cachorro cagando" lá d casa.
Maga
Ótima lembrança, Braga. É como diz Wali Salomão: a memória da gente é uma ilha de edição. Quando se articula bem, sai esses belos textos.
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